sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Pronunciamento de Sônia Guajajara na Coletiva de imprensa em Doha –COP 18 Falar de direitos indígenas, direitos territoriais em tempos que a prioridade é o crescimento econômico por meio do avanço tecnológico e do avanço das produções, torna –se uma competição injusta e desleal. Não digo que somos contra o desenvolvimento do país, mas ele não pode crescer deixando seus filhos pra trás nem tão pouco desconsiderar os Direitos existentes. O Brasil,tem se apresentado normalmente como um país líder e economicamente relevante no contexto mundial, que avançou supostamente na implementação de políticas de inclusão social, por tanto na superação da pobreza e das desigualdades, lamentavelmente na realidade não é isso, especialmente com relação à proteção e promoção dos direitos dos povos e comunidades indígenas. O modelo de desenvolvimento adotado pelo Brasil tornou-se irreversível, implicando na priorização do crescimento do país baseado no processo de reprimarização da economia, das comodities provenientes da industria extrativa, sobretudo mineral, e do agronegócio. O modelo de desenvolvimento do Brasil baseia-se claramente na industria extrativa agroexportadora. Esse modelo requer necessariamente da ampliação de infraestruturas, ou seja, da implantação de grandes empreendimentos (hidrelétricas, ferrovias, hidrovias, portos, linhas de transmissão etc.) que inevitavelmente impactam terras e territórios, a vida socioeconômica, física, cultural e espiritual dos povos indígenas e de outras populações locais. Em função desse modelo, o governo tem sido omisso e conivente com a ofensiva aos direitos indígenas praticados por meio de medidas administrativas, legislativas e jurídicas antiindígenas nos distintos poderes do Estado. Há uma notória pactuação com setores políticos e econômicos (latifundiários, agronegócio, mineradoras, empreiteiras, bancos e outras corporações) contrários aos direitos indígenas, interessados nos territórios indígenas e suas riquezas (minerais, hídricas, florestais, biodiversidade), em troca de apoio à sustentabilidade e governança requerida pelo Executivo. . Leis antiindígenas PEC 215/00. Esta PEC tem o propósito de transferir para o Congresso Nacional a competência de aprovar a demarcação das terras indígenas, criação de unidades de conservação e titulação de terras quilombolas, que é de responsabilidade do poder executivo, por meio da FUNAI, do IBAMA e da Fundação Cultural Palmares (FCP), respectivamente. A aprovação da PEC 215 - assim como da PEC 038/ 99, em trâmite no Senado, põem em risco as terras indígenas já demarcadas e inviabiliza toda e qualquer possível demarcação futura. O risco é grande uma vez que o Congresso Nacional é composto, na sua maioria, por representantes de setores econômicos poderosos patrocinadores do modelo de desenvolvimento em curso. Projeto de Mineração. A bancada da mineração, tem o propósito de aprovar, o Projeto de Lei (PL) 1610/96 que trata da exploração mineral em terras indígenas. O texto do relator, ignora totalmente salvaguardas de proteção da integridade territorial, social, cultural e espiritual dos povos indígenas, desburocratiza a autorização da pesquisa e lavra mineral em terras indígenas, com fartas facilidades e condições que permitem o lucro fácil e avolumado das empresas envolvidas. pouco contato, ao submeter o seu destino aos princípios da segurança nacional; relativiza ou afasta de forma ridícula a participação do Ministério Público Federal do seu papel de proteger os direitos indígenas; enterra a autonomia dos povos indígenas, ao submeter a sua decisão de não querer mineração à deliberação de um comissão governamental deliberativa que deverá dizer qual é a melhor proposta para as comunidades, ressuscitando dessa forma o indigenismo tutelar, paternalista e autoritário. Enfim, minimiza o alcance do direito de consulta estabelecido pela Constituição Federal e a Convenção 169 da OIT; Medidas administrativas e jurídicas contrarias aos direitos indígenas. O Governo Federal tem publicado nos últimos dois anos uma série de Decretos e Portarias contrários aos Direitos indígenas, como: Portaria 2498/2011 que objetiva a participação dos entes federados (Estados e municípios) no processo de identificação e delimitação de terras indígenas; ao editar esta medida, o governo ignorou o Decreto 1775/96 que institui os procedimentos de demarcação das terras indígenas e que já garante o direito do contraditório alegado para a criação desta Portaria. Portaria 419/2011, que regulamenta a atuação do órgão indigenista, a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), em prazo irrisório, nos processos de licenciamento ambiental, para facilitar a implantação de empreendimentos do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC (hidrelétricas, mineração, portos, hidrovias, rodovias, linhas de transmissão etc.) nos territórios indígenas. Portaria 303 / 2012, Esta Portaria, busca estender para todas as terras indígenas as condicionantes decididas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Judicial contra a Terra Indígena Raposa Serra do Sol (Petição 3.888-Roraima/STF). O Governo editou a Portaria mesmo sabendo que a decisão do STF sobre os embargos declaratórios da Raposa Serra do Sol ainda não transitou em julgado e estas condicionantes podem sofrer modificações ou até mesmo serem afastadas pela Suprema Corte. A Portaria afirma que as terras indígenas podem ser ocupadas por unidades, postos e demais intervenções militares, malhas viárias, empreendimentos hidrelétricos e minerais de cunho estratégico, sem consulta aos povos e comunidades indígenas e à FUNAI; determina a revisão das demarcações em curso ou já demarcadas que não estiverem de acordo com o que o STF decidiu para o caso da Terra Indígena Raposa Serra do Sol; ataca a autonomia dos povos indígenas sobre os seus territórios; limita e relativiza o direito dos povos indígenas sobre o usufruto exclusivo das riquezas naturais existentes nas terras indígenas assegurado pela Constituição Federal; transfere para o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO) o controle de terras indígenas, sobre as quais indevida e ilegalmente foram sobrepostas Unidades de Conservação (UCs); e cria problemas para a revisão de limites de terras indígenas demarcadas, que não observaram integralmente o direito indígena sobre a ocupação tradicional. Todas estas medidas, contrário ao que alega o governo, tem criado um clima de apreensão e tensionamento que agrava a insegurança jurídica e social já instalada há décadas, aumento de conflitos agrários entre indígenas e agricultores, aumento da exploração ilegal, exatamente em razão da morosidade do Estado em reconhecer, demarcar e proteger as terras e territórios dos povos indígenas. Casos atuais de violências e violações de direitos: Recentemente dia 07/11 – Um indígena do povo MUnduruku –MT, foi assassinado brutalmente durante uma operação da Polícia Federal em territóriojá demarcado; No MS, indígenas Kadiwéu são despejados de Terras homologadas há mais de um século e Guarani Kaiowá sofrem a ataques dos mais diversos tipos e são assassinados dentro de suas casas, como se não bastasse, os pistoleiros matam e desaparecem com os corpos e ainda culpam os indígenas pela violência; No RS, Indígenas Kaingang e Mbyá vivem às margens das estradas acampados sob o intenso frio do Sul do país, sobrevivendo há décadas em pequenos pedaços de terra entre as cercas do latifúndio e o asfalto das estradas e ferrovias. No Vale do Javari-AM, cerca de 4 mil indígenas não tem saúde, ou em situação calamitosa, doenças consideradas erradicadas matam diariamente como é o caso da Hepatite B instalada na região. Hoje 85% da população está contaminada com o vírus e tem um índice gravíssimo de morte. AWÀ –Guajá – MA, a expansão da Ferrovia Carajás pela mineradora Vale, promoverá o desaparecimento das florestas e da fauna que são fonte de vida desse povo e que hoje, ainda têm suas terras invadidas por madeireiros que abrem estradas clandestinas e adentram na mata acabando também com a Terra Araribóia. Tembé – PA, madereiros invasores atearam bala contra lideranças indígenas e Policiais que faziam o monitoramento da Terra. Um indígena ficou desaparecido por 36 horas na mata ( há duas horas atrás foi encontrado), e o clima de tensão na região se agrava a cada dia por falta da insegurança e ataques freqüentes em represálias a quem defende a floresta. No Nordeste, criminalização constante e violência constante contra os indígenas. Não posso seguir relatando porque meu tempo está terminando, mas ressalto que estes são apenas alguns dos muitos que estamos enfrentando. E porque estou falando tudo isso aqui?? Muitos devem está se perguntando, e o que isso tem haver com o Clima que é o foco da Conferência?/ Todas essas ameaças e violações de direitos estão intrinsecamente ligados ao assunto em pauta, pois todos sabem que os povos indígenas são os que mais contribuem para a preservação das florestas, do meio ambiente, da natureza, comprovadamente as Terras indígenas apresentam uma barreira contra o desmatamento e consequentemente evita emissões de gases de efeito estufa, uma vez que as maiores emissões do Brasil estão ligadas ao desmatamento, degradação e queimadas. Sendo nós povos indígenas os protagonistas na preservação das florestas, e que milernamente temos uma relação harmoniosa com a natureza, se perdermos nossos direitos sob os Territórios, haverá um impacto significativo para o aumento ainda mais das emissões e consequentemente um aumento do desequilíbrio do clima no planeta, pois perdendo nossos territórios as florestas perdem seus legítimos guardiões. Revogação Já da Portaria 303, PEC 215, PEC 038 e todas as medidas governamentais que restringem nossos direitos!! Este pronunciamento fo baseado na Carta pública da APIB, no Abaixo assinado do Grupo Eu apoio a causa indígena e do CIMI. Sônia Guajajara Vice Coordenadora –COIAB Membro da Direção Nacional da APIB