segunda-feira, 12 de outubro de 2009

ÍNDIOS DO NOSSO TEMPO- o espaço de dialógo intercultural


ÍNDIOS DO NOSSO TEMPO- o espaço de dialógo intercultural


Amigos da coluna Índios do nosso tempo saúdo a todos. Peço minhas sinceras desculpa por esse lapso de comunicação, mas algumas coisas estavam se acertando e realmente fora o link com o movimento da Terra Indígena Vale do Javari, muito pouco ou quase ninguém entrou em contato pelo email e colocou suas questões, para instigar você leitores, tratarei aqui de um tema polemico esperando que agora as pessoas entrem em contato e teçam comentários pró e contra a temática de nossa coluna ‘O INFANTICIO NAS COMUNIDADES INDIGENAS’.
Ressalto a todos os leitores, que o que se busca aqui e apontar diferentes visões e pontos de vista, sem nenhuma intenção de ser a verdade absoluta ou que somos os donos da verdade. Que temos realmente a certeza da atitude, do teor e da nossas decisões, que somos capazes de lidar e solucionar os mais diversos ‘problemas’ que se apresentam em nossa existência. A humanidade com suas peculiaridades e organizações sócio-culturais distintas elaboram ao longo da história formas distintas de lidar e se organizar perante os dilemas e tabus, construídos e destruídos ao longo de toda nossa formação.
A questão que abordo aqui é bastante polemica, pois envolve os direitos humanos, toda nossa formação educacional judaico-cristã e tem feito parte das discussões a respeito da cultura dos povos originários, há tempos atrás, andou circulando pela internet vídeos discriminando, repudiando e buscando realizar uma enorme campanha para se intervir junto às comunidades (mas do que já de costume) e proibir em sua totalidade o infanticídio praticado em algumas sociedades indígenas.
Muitas notícias veicularam a proposta de um projeto de lei que trata da obrigatoriedade de intervenção do Estado em realidades onde se supõe que o infanticídio ocorra, o projeto de Lei nº 1057 do deputado Henrique Afonso (PT-AC) conhecido como Lei Muwaji.
O projeto de Lei Muwaji se baseia nos direitos humanos, porem parte de premissas equivocadas e preconceituosas em relação ao tratamento concedido às crianças indígenas por distintos povos. O tema do infanticídio carece de dados confiáveis, seja sobre a incidência, seja em relação aos povos que recorriam a tal prática e, ainda, sob que circunstâncias.
Em grande parte dos trabalhos etnográficos apontam que ao contrario do busca-se apresentar, as crianças indígenas gozam de atenção da comunidade e os pais a acompanham as fases de desenvolvimento dos filhos, observando ritos de passagem e buscando o bem-estar de crianças e jovens.
Já os ‘especialistas’ do legislativo partem do pressuposto que os ambientes familiares indígenas são bárbaros, ao se referir genericamente à existência de práticas nocivas a vida das crianças.
O texto da referida lei, parti da infundada suspeita de que os índios são cruéis com suas crianças contribuindo assim, para desmoralizar e criminalizar a imagem do índio perante a opinião publica sem qualquer tipo de investigação e exposição mais ampla dos ‘dados’.
Com relação aos ‘dados’ é sempre bom antes de qualquer espécie de julgamento, a idéia de relativizar, colocar o dedo apontado exclusivamente para os povos indígenas camufla as praticas similares ao ‘infanticídio’ (aceitando a premissa que é isso que os índios realizam com as crianças que nasçam sob ou com algum tipo de ‘problema’) que ocorrem em um numero muito maior, sem sanção alguma em nossa ‘sociedade moderna industrial’, e desigual. Nos EUA, por exemplo, cerca de 1 milhão de bebês são vitimas de maus tratos todos os anos e não menos de 20% morrem em virtude disso. Milhares de crianças não indígenas são maltratadas e mortas no Brasil: de duas a seis são assassinadas por dia na cidade do Rio de Janeiro e outras tantas morrem por falta de alimentação e cuidados médicos.
Não se trata de ser pró ou contra o infanticídio entre indígenas, mas sim de assegurar o respeito às tradições culturais de todos os povos originários e, buscar compreender deles realmente, sua maneira de perceber, e entender não apenas o infanticídio, mas o mundo, sua maneira de explicá-lo, com também o lugar de onde vem, onde habitam e como vivem no coletivo, assim, aprendemos algo com os povos indígenas.
A criminalização de práticas indígenas e o incentivo à denuncia Propostos Na lei não promove o estimulo construtivo a reflexão sobre práticas que todos consideramos abomináveis.
Não usurpemos dos povos indígenas o direito e a liberdade de negociar os dissensos por meio de deliberações internas autônomas. Sabe-se que em toda sociedade os valores são construídos e reconstruídos socialmente. Mas não fechemos os olhos imaginando que políticas sociais como bolsa família ou algum tipo de incremento financeiro a famílias com filhos especiais, no caso indígena ira possibilitar a mudança do ethos/olhar e sua maneira própria de solucionar seus problemas.
Quanto aos valores e as soluções encontradas ate aqui pela ‘sociedade moderna industrial’ estão longe de serem referencias para um mundo melhor.
Criamos um dano ambiental global e estamos longe de estar caminhado na direção contraria ao colapso, então deixemos aos indígenas as escolhas que fazem para suas vidas e projetos de futuro.
As declarações internacionais das quais o Brasil é signatário foram concebidas para humanizar as relações sociais e não para servir como instrumento de intervenção em nome de uma suposta superioridade moral. Cabe assim ao estado de Direito proteger os povos indígenas Para que tenham o direito de existir como sociedades diversas, conforme a constituição de 1988, pela convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a declaração da ONU sobre os direitos dos Povos Indígenas, quaisquer documentos ou ações que interfiram na vida dos povos indígenas carece de consulta aos interessados, portanto que se proceda a consulta, pois ela é um direito.
Comentarios artedomito@hotmail.com
http//:indiosdonossotempo.blogspot.com

Índios do Nosso Tempo, Espaço na tentativa de celebrar e abrir um canal para o dialógo intercultural



Índios do Nosso Tempo
Espaço na tentativa de celebrar e abrir um canal para o dialógo intercultural


Apresentação
Através deste artigo apresento as intenções deste espaço sua origem desde seu nome ate atual busca pra estabelecer este como ponto de dialogo sobre assuntos e temas relacionados a situação atual dos povos indígenas.
A educação para uma cidadania plena implica, entre outros aspectos, assumir nossa sociedade como um complexo cultural, constituído historicamente e, em grande parte, formado ao longo de conflitos muitas vezes dramáticos. Nossas identidades são múltiplas, às vezes compondo-se de modo extremamente inovador, doutras de modo lamentavelmente excludente. No caso particular das culturas indígenas, além do reconhecimento de suas diferenças recíprocas (pois a categoria "índio" foi construída a partir da ótica colonizadora), é fundamental trazê-las para a visibilidade mais ampla da sociedade como um dos meios que permitam restituir sua dignidade e delas fazer parte constituinte e consciente do que somos. Este espaço pretende, neste sentido, oferecer os recursos, como a mídia de grande capacidade de abrangência e circulação, para documentar, propagar, promover a discussão e contribuir para a formação de cidadania das novas gerações.
O nome veio do projeto ÍNDIOS DO NOSSO TEMPO (Universidade com índios) teve origem em 2002 na Universidade Federal Fluminense onde participamos e desenvolvemos atividades como um projeto de extensão. Expedições de documentação na Terra Indígena Kanela, em 2003 na T.I Alto Turiaçu, junto à etnia Ka´apor, ambas no Maranhão. Além disso, foi realizada e filmada a apresentação do coral de crianças dos índios Guarani na aldeia Sapucaia- RJ e promovidas oficinas de pintura corporais, danças e cantoria durante Segundo Encontro de Culturas- Interculturalidades-Centro de Artes- Departamento de Difusão Cultural –UFF, Rio de Janeiro, entre outras atividades.
No ano de 2005, o projeto participou, na França, das comemorações do Ano do Brasil na França, com exposição, exibição de vídeo, palestras e com a participação de 08 indígenas Kayapo, atividades que foram realizadas com os apoios da PROEX-UFF, do MinC e das instituições francesas.
Os povos indígenas vêm sofrendo toda sorte de constrangimentos à sua sobrevivência física e cultural enquanto ‘povos’ culturalmente diferenciados.
Devido à influência de uma forma predatória de contato intercultural com a sociedade envolvente, ocorre um processo de descaracterização da cultura econômica e material destes indígenas e a desvalorização dos aspectos simbólicos (cosmologia; religião; etno-medicina xamânica; etc.) de sua cultura.
Igualmente surge um momento em que a sociedade global se questiona em relação aos seus valores e reconhece os conhecimentos destes povos, anteriormente tidos como “primitivos”; “irracionais”; “incivilizados” e outros tipos de desvalorizações racistas, de forma altamente valorizada. Principalmente em relação aos valores espirituais e ecológicos, os etno-médicinais, as culturas “tradicionais” e indígenas brasileiras passam a ser vistas, mais e mais, pelo pensamento científico; técnico e artístico, como fonte de inspiração e conhecimentos altamente positivos.
Desta forma, sem querer negar a história e o relacionamento interétnico, que transforma todas as culturas, e em grande parte favorece a própria cultura a se re-significar, tanto o povos indígenas quanto a nós, como a sociedade global em geral, poderemos ser beneficiadas por esta parceria.
Três as motivações que nos levaram a desenvolver, desde 2002, atividades relacionadas às culturas indígenas brasileiras (e que aqui serão como as diretrizes pra futuras publicações neste espaço):
1o) A escassez de informações às quais tem acesso a sociedade brasileira sobre a realidade vivida pelas populações indígenas, sua história e cultura e atuais desafios de sobrevivência e afirmação da identidade;
2o) A limitação de meios e oportunidades para que os próprios indígenas formulem e apresentem sua versão do mundo em geral e de suas culturas em particular;
3o) A necessidade de fornecer a estes grupos indígenas informações e conhecimentos sobre a sociedade abrangente a fim de proporcionar-lhes meios de melhor nela se situarem e de decisão sobre as formas de interação que lhes cabe decidir adotar.
É importante acrescentar que as sociedades indígenas são objeto, há séculos, de interpretações equivocadas e freqüentemente preconceituosas, fato que fortalece o nosso papel de contribuir para um esclarecimento que dissipe estas percepções. O espaço Índios do Nosso Tempo propõe um novo olhar, pretendemos contribuir para que as imagens apresentadas aqui, pelos próprios indígenas possam contribuir para uma visão mais próxima de suas realidades.
Resta esperar- e esta idéia tencione-se fomentadora desta nova visão, que as relações que com elas se estabeleçam a partir de agora sejam mais justas.
Buscaremos aqui nos apropriar e utilizar a mídia escrita para a documentação das culturas indígenas e como material para a preservação de sua memória, de esclarecimento da sociedade abrangente e como meio de intercâmbio e diálogo entre grupos indígenas distintos e destes com a sociedade em geral; e de fundamental a participação a incorporação de todos na elaboração, não só para lhes garantir maior autenticidade, mas para que se realize o ideal do dialogo.
Principalmente buscaremos ao longo das publicações problematizar temáticas que afligem, questionam e se acercam do universo indígena, discursos que dominam o consenso comum quando se defronta com uma outra cultura;
Envie suas propostas, comentários e sugestões para o endereço eletrônico artedomito@hotmail.com
Ate o próximo, com as propostas e temas sugeridos por vocês leitores!
Obs: a charge foi divulgada em um jornal do Peru sobre a situação dos índios isolados ha algum tempo atras, um amigo (Kiko) me cedeu.

Fotos do Congresso de Medicina Tradicional realizado em Tarapoto, junho/2009- Peru.







quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Relatos do Peru: o Congresso em Tarapoto e os acontecimentos em Bágua


Relatos do Peru: o Congresso em Tarapoto e os acontecimentos em Bágua

O Congresso Internacional de Medicina Tradicional, Interculturalidade e Saúde Mental que aconteceu em Tarapoto no Peru, abordou temas de profundo interesse para uma política sobre conhecimentos tradicionais Indígenas, e principalmente na busca de um melhor dialogo com os países da América latina.
Foi organizado pelo Takiwasi (casa do canto), é um centro de reabilitação de toxicômanos e de pesquisa sobre medicinas tradicionais. Fundado em 1992, na alta Amazônia peruana, tem como seu objetivo geral valorizar os recursos humanos e naturais das medicinas tradicionais elaborando uma verdadeira alternativa terapêutica.
O Congresso teve como proposta, o dialogo sobre as plantas tradicionais amazônicas suas utilizações rituais e terapêuticas com forte enfoque nas relações interculturais e na abordagem das questões pertinentes aos “xamas mestiços” (e /ou também conhecido como neo-xamanismo, onde não-indígenas são ‘legalizados’ nas praticas xamanicas) percebendo as potencialidades e a problemática destas praticas na valorização e reconhecimento da matriz indígena de transmissão e utilização deste conhecimentos.Voltado para dimensão espiritual e da utilização das plantas psicoativas que induzem a estados alterados da consciência, como técnicas alternativas de tratamento.
Há algumas décadas existem múltiplas experiências, de projetos interculturais entre médicos, curandeiros, iniciativas no campo terapêutico, educativo, acadêmico, de investigação. A diversidade e dispersão dessas práticas não permitem ter uma visibilidade adequada. E este evento possibilitou o encontro de indígenas e de diversos pesquisadores de todo mundo nas áreas de antropologia, medicina, psicologia entre outros.
Teve como prioridade dar a palavra a pessoas com experiência clinica, a projetos interculturais principalmente relacionados à saúde mental e que se atreva a tratar abertamente dos temas “tabu”. Buscou também falar sobre as potencialidades das medicinas tradicionais e também de suas possíveis limitações.
Foi uma grande possibilidade de promover a preservação e desenvolvimento das medicinas tradicionais, seus estudos, as condições de uso, fomentando uma articulação com a medicina ocidental e outros beneficio para os povos indígenas como para sociedade como um todo.
O congresso ficou dividido nos eixos temáticos:

- Política em saúde mental, interlocução das medicinas tradicionais.
Neste eixo realizei uma apresentação sobre os dilemas indígenas do Vale do Javari, suas angustias, os altíssimos casos de malaria e hepatite. Fazendo um contra ponto com sua maneira tradicional de perceber o conceito de saúde e doença e também apresentando como exemplo, a história de pós-contatos do povo Matis.

- Toxicomania e estados alterados de consciência.

- Saúde mental e povos indígenas.

-Medicina tradicional e psicoterapia.

-Investigação cientifica e interculturalidade.
Aqui neste tema pude aprofundar os conceitos de saúde e doença de alguns povos indígenas, onde o conceito de saúde que perpassa por estar e se manter saudável, bem disposto. Apresentei alguns projetos que desenvolvo com os Kayapo (povo indígena do Estado do Para, seus produtos e medicina da floresta) e o recente projeto sobre as plantas da farmacopéia Matis, onde pude sensibilizar os participantes para questões sobre o desrespeito que durante anos fez com que estes indígenas fossem se “esquecendo” de suas praticas, e criando cada vez mais uma dependência com relação aos medicamentos da sociedade envolvente. Pude, desta maneira apresentar o trabalho de pesquisa que apoio do jovem professor pesquisador Make Bush Matis, que junto a alguns velhos como, Tumi Preto e Tupa Matxon vem construindo um grande catalogo sobre seus métodos, plantas, e formas de tratamento.
O congresso ainda realizou uma serie de vivências sobre utilização de plantas e praticas de estados alterados de consciência.
Mas nem tudo foi, e ou esta uma maravilha (ate o fim desta edição a solução estava longe de ser encontrada) ao iniciar o congresso houve um grande conflito na cidade de Bágua, impossibilitando a chegada de alguns participantes que viriam por via terrestre.
O conflito (que aconteceu nuns sábado dia 6 de junho) ocorre, pois a concessão que o governo peruano vem realizando se sobrepõe aos territórios indígenas e ainda mais, a justificativa de tal mobilização indígena acontece, pois o governo vem fazendo uma serie de decretos legislativos que são verdadeiros atentados aos povos indígenas, beneficiando o Tratado de livre comercio e aos EUA, fazendo propostas nos temas florestais, de água, desapropriação de terras em beneficio das empresas transnacionais.
O pior de tudo é que em nenhum momento os povos indígenas foram consultados o que desrespeita a lei 169 OIT, que exige a consulta previa aos povos originários. Desta maneira essas leis deveriam ser revogadas o que não aconteceu.
É um verdadeiro movimento para o desaparecimento dos povos indígenas para que as transnacionais se utilizem dos “benefícios” como a mineração, exploração de Madeira, gás e petróleo.
A AIDSEP (Associação inter-étnica para o desenvolvimento da selva peruana), junto com outros movimentos e povos indígenas, mestiços organizaram o fechamento da estrada durante 56 dias, então o governo decretou Emergência em Bágua, o que o autoriza entre outras atrocidades a entrada da policia e de matar para manter a “ordem”. Criminalizando os protestos.
Segundo a versão do governo de Alan Garcia, seriam três indígenas e 24 policias, mas relatos de motoristas que passaram pos conflito pela estrada, seriam mais de 30 mortos que estariam expostos ao longo da beira da estrada, corre ainda mais informações que foram encontrados corpos em sacos plásticos ao longo do rio, mas essas são informações não oficias já que o governo controla as informações.
Mas mesmo assim a atrocidade cometida no dia 6 de junho já desencadeou a renuncia de ministros do governo.
O governo peruano por outro lado culpa o presidente da AIDSEP, O senhor Alberto Pizango de ser o responsável pelo distúrbio, este teve que se refugiar na embaixada da Nicarágua, e aguarda ate o momento a autorização para se manter em asilo político.
Muito ainda vai acontecer para se manter informado consulte http://www.servindi.org/ e http://www.aidesep.org.pe/
Pode parecer que não é nada para nos os Brasileiros, mas lembrem-se, é só mais um exemplo do fracasso da política da sensatez e do dialogo e de negociação como mecanismo de solução da diferença, é o triunfo da intolerância, prepotência, da balas e da morte, nem tanto distante dos massacres ocorridos na T.I. Raposa Serra do Sol, e em tantos outros rincões de nosso território que não chega aos meios de comunicação, fiquemos atentos.

Textos Rafael Pessoa - antropólogo
Fotos Rafael Pessôa e Ramiro Solsol Conde