sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Apontamentos sobre o feminino nas comunidades indígenas


Apontamentos sobre o feminino nas comunidades indígenas
Estimados leitores como matéria de fim de ano, desejando a todos um feliz ano novo de 2010, um ótimo natal, de compreensão harmonia e paz.
Nos últimos dias pude vivenciar algumas atividades na fronteiras realizadas na Universidade Nacional da Colômbia, UNAL, sede de Letícia com algumas organizações de mulheres indígenas dos povos da fronteira. Tikuna habitantes de ambos países, Uitoto, entre outros. Pudemos organizar a participação de duas indígenas Marubo também no Seminário mulher indígena, conflito e meio ambiente, que conduziu as reflexões problematizando gênero, a importância de realizar grupos de trabalhos sobre as questões das mulheres indígenas, o manejo do ambiente, com atividades didáticas produziu com as mulheres uma cartografia social da utilização dos espaços nos territórios e as questões da vida urbana indígena na Amazônia.
Foram narrados os conflitos de interesse entre o ‘domínio’ dos curacas, homens suas formas de atuação nas questões de defesa e garantia dos direitos e do território, da própria submissão das atividades e articulações femininas nesse contexto. As indígenas puderam estabelecer comparativos com a situação das diferentes nações na relação e ao contato com o Estado-nação falaram das perdas na barganha advinda deste contato.
As dificuldades enormes dos diálogos multi-étnico, com o problema da corrupção e burocracia nas ações de políticas publicas, dificuldade da compreensão dos diferentes olhares no contexto educacional, da saúde entre os povos originários e os ‘brancos’.
A herança do lixo, os aterros sanitários que buscam afastar dos olhos do plano urbanístico (ao menos nos próximos anos), entendendo que faz parte da idéia de estar mais organizado, porém mais desordenado. Não se planeja a ação para o bem estar coletivo, só quando for individualmente lucrativo, ou seja, só se organizara propostas como a coleta seletiva do lixo, a reutilização e reciclagem só serão aplicadas, quando for um mercado lucrativo, para isso temos que possibilitar o acúmulo de toneladas de matéria prima para um futuro empreendimento rentável.
As propostas e planos de vida indígenas para o futuro estão centralizados em perspectivas e patamares muitos distintos, as mulheres discursavam sobre a relação pessoal que mantém com o território, as chácaras, os dilemas que enfrentam, por exemplo, na Colômbia nos resguardos, que tem uma legislação, diga-se de passagem, distinta da que temos no Brasil, com as Terras indígenas, quilombos, Parques, Áreas de Proteção, Reservas Ambientais, Extrativistas, etc.
O Brasil por outro lado, tem dado ênfase ao conceito de tombamento tanto da cultura material, mas principalmente a imaterial os modos e forma de fazer e apreender o mundo. As questões ligadas à auto sustentabilidade, do território das praticas culturais mantém assim certo fantasma da extinção e suspeita de desaparecimento da sua língua, etnia e/ou tradição. É verdade que estas ações são uma importante ferramenta na luta pelo reconhecimento, mas é importante perceber que por trás dessas ações, pode camuflar uma nova ordenação da cultura dos povos originários, realizando releituras de aspectos rituais, cerimônias sobre a ótica de dança, folclore, ou ainda pior, artesanato, teatralização e souvenir para o mercado em expansão do turismo.
Muitas das questões nos territórios indígenas da Colômbia passam por questões estruturais como não ter água, luz, problema de saneamento básico e estruturais, grande parte de sua produção já são direcionadas ao mercado para aquisição de bens de consumo. Há ainda as vendas de partes das terras dos resguardos para ‘finqueiros’, fazendeiros para exploração e criação de gado ou mesmo para recomprá-las com financiamento e facilidades do governo.
Diferente por exemplo, da Terra Indígena Vale do Javari que sofre com problemas calamitosos na área de saúde, o não cumprimento das propostas do órgão publico que programa as ações em saúde e atendimento das enfermidades, não por falta de financiamento, muito mais pelo o que creio ser um dos grandes problemas da America Latina, a má utilização e aplicação dos recursos, que não são utilizados para o que foram destinados. Os diversos povos que vivem no Vale do Javari, e os muitos ainda ‘não contatados’ ainda salvos de estarem infectados pelos ‘prazeres luminosos’, fugazes da sociedade nacional envolvente, estão pouco inseridos no mercado socío-econômico-cultural, e vem estabelecendo aos poucos, projetos dentro de seus territórios, porem, fora algum artesanato e banana (excedente das roças) que esporadicamente levam para serem vendidos nas cidades (onde compram óleo, açúcar, e outros bens de primeira necessidade, do qual não são auto suficiente), mas estes índios não participam nem tem sua lógica de produção voltada para mercado mas sim, para o consumo dentro das próprias comunidades e famílias. Com os Tikuna não é assim tão diferente, foi interessante ouvir de Tikuna ‘colombianos’ sobre a origem comum do povo Magüta, no território (hoje Brasil) Eware, relativizando as fronteiras entre países e afirmando um tempo anterior de dinâmicas dos povos originários. As dinâmicas e tempos de ‘guerra’ entre Peru e Colômbia também foi lembrado.
Para concluir lembro o mito de Catxekwy, de povos Jê do Brasil central (Kayapo, Timbira, etc). Essa história remonta a época em que os índios comiam mel e apenas algumas espécies de plantas. Esses povos são matrilocais (a residência pertence à mulher, indo o homem ao casar habitar a residência da sogra) então os rapazes solteiros têm o costume de quando estão em idade para namorar vão dormir no centro da aldeia, no pátio, olhando as estrelas e a lua em suas enormes aldeias circulares.
Numa noite dessas um jovem foi surpreendido por uma rã que insistiu por algumas vezes em subir no seu peito, e quando irritado já estava por tomar uma atitude mais extremada, a rã falou com ele e de pronto se transformou numa linda mulher. Logo disse que havia visto ele lá do alto céu, de onde ela vinha. Disse que gostou dele e queria ficar com ele, mas advertiu que ninguém poderia saber de sua existência na aldeia, então ela a colocou numa cabaça (outras versões falam que ela se transformou em cabaça) e durante o dia o jovem olhava para cabaça com alegria e felicidade e toda a noite ela saia, aparecendo para ele e foram felizes ate um dia que uma das irmãs do jovem curiosa com a situação resolve ver a cabaça e descobre a mulher, Catxecwy.
Na noite ao encontrar o jovem indígena, Catxecwy relata tudo que aconteceu e diz que desta maneira terá que ir embora, ele reclama, chora e por fim aceita o destino de seu afeto.
Antes de voltar para o céu Catxecwy, ensina ao jovem indígena sobre os diversos alimentos comestíveis que até então eles desconheciam de seu território, despedisse e vira a estrela que para nós chamamos de Vênus.
O que deixo marcado aqui a importância do feminino indígena na educação, conhecimento, preservação e manutenção das praticas culturais e que mesmo sob forte ‘submissão’ ao mundo machista, criam leituras e apresentam outros caminhos e interpretações possíveis. A grande revolução esta na mudança de paradigma sobre os encaminhamentos de nosso futuro, as mulheres mesmo como diz na letra da canção de Jonh Lennon ‘woman is a nigger of the world’ tomando conhecimento de sua condição poderão apresentar propostas mais satisfatórias, interessantes aos dilemas e encruzilhadas que vivemos atualmente. Por fim minhas homenagens a um dos grandes mestres imortais da etnologia, Claude Lévi-Strauss que recentemente nos deixou.
Ate o próximo ano!

Fotos complementares dos indígenas Quechua e Urubu Kaapor







segunda-feira, 9 de novembro de 2009

A RELAÇÃO DOS CIDADÃOS DO MUNICIPIO DE BENJAMIN CONSTANT COM O MUSEU MAGÜTA- POVO INDÍGENA TIKUNA. APONTAMENTOS SOBRE MUSEUS, AFINAL PRA QUE UM MUSEU?

Estimados leitores, vamos aqui para mais um artigo de nossa coluna, lembramos que nosso tom sempre provocativo é devido à idéia de estabelecer dialogo com a mais vasta gama de pensamentos sobre os temas que aqui decorremos e que nós todos nos posicionemos sempre sobre os temas!
Lembro ainda que mantemos um blog, http:/indiosdonossotempo.blogspot.com onde estão as matérias, com mais fotos (que salvo o primeiro artigo sobre o Congresso em Tarapoto –Peru, contou também com a colaboração de um fotografo do evento) que são de minha autoria, de povos indígenas do Maranhão, Mato Grosso, enfim...Nesta edição estaremos discorrendo sobre uma situação especifica e peculiar que havia lido há tempos atrás em um artigo do professor Jose de Ribamar Bessa Freire (que alias numa recente breve pesquisa na internet parece que andou utilizando escritos meus sobre os Kayapo-mas como não teria sido publicado e sim dialogado/escrito na pós-graduação em educação indígena da UFF em 2006..., mas bem). O artigo “a descoberta dos museus pelos índios” se salvo engano, foi publicado em 1999, apontava sobre certo etnocentrismo, que agora estamos podendo vivenciar. Sendo este o tema que trata nossa coluna aqui, A RELAÇÃO DOS CIDADÃOS DO MUNICIPIO DE BENJAMIN CONSTANT COM O MUSEU MAGÜTA- POVO INDÍGENA TIKUNA. APONTAMENTOS SOBRE MUSEUS, AFINAL PRA QUE UM MUSEU?
Não tentaremos descrever ou explicar quem são os Tikuna, outras informações possíveis sobre este povo e a questão geopolítica que envolve o que este povo e o tema aborda ver autores como João Pacheco, Curt Nimuendaju, entre outros (uma pesquisa pode ser realizada na biblioteca que há anexo ao museu Magüta), aqui me concentro numa perspectiva especifica de olhar a relação entre paisanos benjaminenses e indígenas.
A Formação do Museu Magüta deu-se em 1988, época da nova Constituição Brasileira, lembra-se? Neste época, os Magüta/Tikuna lutavam pela defesa e garantia de seu Território (hoje tudo parece mais tranqüilo com a OIT 169, entre outras melhorias no dialogo intercultural), mas neste recente passado os povos originários sofriam por todo país, e ali nos rincões da Amazônia não seria diferente. Grupos armados, madeireiros entre tantos outros representantes da ‘frente de expansão’ entravam em conflito periodicamente com os indígenas.
Os Tikuna junto com pesquisadores de outros lugares do país, como a Dra. Jussara Gomes Gruber, passaram pelo menos três anos pensando/discutindo, a organização e montagem da coleção do Magüta. Bem verdade, acreditamos que durante este período os indígenas puderam não apenas colaborar com as pesquisas dos etnólogos, historiadores e lingüistas, como ‘incorporaram’ um importante “aliado” (alem dos pesquisadores e indigenistas que se imbuíram da causa) à sua luta e ao seu discurso étnico, pois naquela época, este povo teve que lutar também para ser reconhecido como um ‘grupo indígena brasileiro’ (tem território em outros países) e assim também seu Território reconhecido. O museu como arma, o museu espaço que daria/deu/dá à legitimidade ao movimento e reconhecimento aos indígenas enquanto diferença, demonstrou neste período ser um grande “aliado”.
Mas sofreram uma dura oposição por parte dos Políticos, (e atualmente percebe-se certa invisibilidade perante a cidade, mesmo sendo principal atrativo turístico da cidade) Latifundiários, e principalmente os Madeireiros, chegando estes a cooptar apoio da população de Benjamim Constant para manifestações nas ruas, gestos de hostilidade, de ridicularizar e menosprezar a imagem do povo, categorizando os indígenas como “caboclos” (categoria mais próxima da possível idéia de ‘branco’ que são os paisanos locais que, o ‘branco civilizado industrial turista’ que se pretende demarcar enquanto distinção).
Em meio a protestos e ajuda da imprensa, que cumprindo seu papel apresentou os fatos denunciando as autoridades locais, o museu foi inaugurado em 1991, conquistando prêmios pelo esforço, destaque para “Museu Símbolo de 1995” pelo ICOM, e também o dado pelo IPHAN por sua preservação da cultura brasileira.
Mas, curiosamente nos dias de hoje, o Magüta continua enfrentando se não tanto mais a hostilidade, com certeza a invisibilidade e não participação dos cidadãos no dia a dia, na relação com o museu e sua história com a própria identidade da cidade e da população local. É um espaço para ser celebrado, mas é ignorado pela população do município.
Os Tikuna afirmam que o museu é indígena, mas também de todos de Benjamim Constant que alias tem livre acesso ao museu, mas mesmo assim não freqüentam e não abraçam o museu.
Mesmo sendo também importante a nível econômico- trazendo turistas ao município e movimentando a estagnada circulação de bens de consumo, informação, dinheiro e tanto mais, não recebe nenhum apoio, incentivo fiscal da prefeitura, não há nenhum tipo de convênio com a companhia de energia para isenção das taxas-e vez por outra estão em dificuldades, pois o que mantém toda estrutura nos dias atuais é praticamente a visitação de turistas que pagam cerca de cinco reais por uma visita guiada. Nem mesmo, ate os dias de hoje estabeleceu-se incrementos de pesquisa com a Universidade Federal do Amazonas, que mantém um campus na referida cidade.
O artigo de Bessa Freire, escrito já há algum tempo, que apontei no inicio de nossa coluna vem descrevendo a situação que nos períodos iniciais da época de formação, inauguração do Museu Magüta (e que atualmente ainda insiste em persistir, mesmo que numa outra perspectiva- e é o que chamo aqui de invisibilidade do museu) os paisanos da referida cidade se referiam (fala o artigo) ao museu com certo ‘preconceito’ afirmando que museu é/era coisa de índio, menosprezando sua importância e tudo mais devido também aos fatos históricos brevemente descritos acima.
Bessa Freire vai estabelecendo ao longo de seu trabalho um comparativo com o conceito/idéia que os grandes centros urbanos como, por exemplo, São Paulo, Rio de Janeiro, e outras metrópoles têm/desenvolveram acerca de museus. As instituições museológicas têm, em sua formação o caráter de ser/pertencer às classes dominantes, aos interesses de um determinado pensamento cientifico/social, de quem controla o ‘sistema’ e/ou a ‘situação’. Os famosos “gabinetes de curiosidades” do século XIX.
Afinal o que constitui um Museu? Seu acervo? A história de sua sede?Os homens que assim o intitularam? Uma das muitas salas de ‘curiosidades’? E ainda, mas o que nele contém? História? Pesquisa? Coleções? O que o museu mostra?Ou pra que ele serve ou se propõe?
Segundo um indígena questionado sobre para que museu? Disse: “Para não esquecer”.
A idéia local dos paisanos sobre museu, afirma o artigo de Bessa, “vem de um etnocentrismo local contra aos indígenas que são tidos como caboclos, não mais índios autênticos”. Mas esquecem de questionar ou perceber que as ‘mudanças de autenticidade’ ocorridas com este povo (e outros mais ao longo da história de ‘contato’) foram em decorrência muito mais, por terem sido escravos no tempo dos seringais, por terem ‘aceito’ e alimentado o sistema exógeno que se apoderou de seus territórios, sua vida, cosmovisao, religião, do que uma feliz vontade. Foi e tem sido sim uma necessidade de “mudar para continuar sendo o mesmo”- diferente... Magüta antes de qualquer outra opção.
O artigo é um tanto irônico ao estabelecer um paralelo com a categoria de ‘caboclo’ para os locais, locais seriam os paisanos do município, que afirmavam-se perante a alteridade indígena Magüta, ser/pertencer a categoria de ‘civilizados’. Mas a categoria ‘civilizado’, defende o artigo, estaria condicionada a um tipo de perfil, que entre outras características, compreende a instituições museológicas como representante de seu conhecimento cientifico (e não coisa de índio), sua maneira (civilizada) de apreender o mundo, englobando outras culturas, cristalizando-as nas prateleiras e catalogações de acervos dos museus. Longe da concepção etnocêntrica e preconceituosa dos cidadãos do município.
Desta forma então, os paisanos do município seriam ‘caboclos’ (categoria negada por quase todos ‘brancos’ Amazônicos), e os Tikuna, índios, que com apoio de pesquisadores puderam concretizar o conceito de museu, um museu étnico de afirmativa indígena, mas, mais do que isso, de re-afirmativa, lá nos idos de 1992, eco-92, da pluralidade étnica, a diversidade intercultural que somos nós, todos brasileiros, mestiços, mulatos, caboclos, índio, amarelo, azul, negro e outros estados nação/irmãos (árabes europeus...). Mas apesar de todo esse movimento e dos prêmios, a cidade ate os dias de hoje se mantém de olhos fechados para a preciosidade que é ter o Magüta na cidade.
Afirmar que museu é coisa de índio, fechar os olhos e não perceber ainda hoje, os erros cometidos, não fazer distinção é manter tudo o que todos nós estamos submetidos, as condições opressoras, de exploração e destruição, é continuar em pleno século XXI á ser colônia. Queremos expor que fora das amarras que nos vinculam a velhos rótulos podemos e devemos fazer a diferença, avaliar o conflito histórico, rever os preconceitos, nos humanizar e comungar juntos com nossas distinções.
Será que todos nós carecemos de uma categoria que nós identifiquemos? Identifique-se? O que é ser índio? Quem gerou este rotulo? Quem usa? Pra classificar quem? E quem é classificado com ele? Por quem? E as mesmas questões com a categoria “caboclo”?
Com a idéia/conceito de museu quase todos identificam a instituição como um lugar de conhecimento, de pesquisa, de estudo, de guardiã da memória, como afirmado acima sempre do olhar do dominante para com sua ou outra cultura, arraigado no pensamento evolucionista, reducionista, etc.
O Magüta é a expressão de um não aceite a essa situação de forma passiva. Os museus construídos por não-índios não serão/são mais o monopólio do discurso histórico que lhes diz respeito. Com o museu Magüta, e outros que estão/foram construídos com o mesmo perfil, se pretende deixar de ser apenas um objeto musealizável e ser também – os povos originários – agentes organizadores de sua memória.
Se o conhecimento do índio for levado a sério pela ciência moderna e incorporado aos programas de pesquisa e desenvolvimento, os índios serão valorizados pelo que são: povos engenhosos, inteligentes e práticos, que sobreviveram com sucesso por milhares de anos na Amazônia. Essa posição cria uma “ponte ideológica” entre culturas, que poderia permitir a participação de povos indígenas, com o respeito e a estima que merecem, na construção de um Brasil moderno”.(POSEY,1992: 43)
Desculpe por expor tão rápido os referidos assuntos eles dão muito “pano pra manga”, pra lembrar uma amiga Barbara e nos últimos dias aqui na região, acontecimentos é o que não esta faltando, estamos envoltos de acontecimentos: o avião que caiu na TIVJ e que contou com o socorro dos Indígenas Matis, com quase todos passageiros escapando com vida (sendo matéria no jornal de domingo da rede de televisão Globo, o Fantástico), ate a germinação de um proto-movimento estudantil com greve e pedido de mudanças no Instituto Natureza e Cultura-UFAM. É as mudanças demoram, mas chegam... Esperamos ser capazes de sair da estagnação e projetar um futuro melhor pra região amazônica que não apenas exploração de seus recursos e da pauperização de seus moradores, apenas como mão de obra barata. Ou com péssimas condições, sucateamento de educação, pesquisa, saúde, entre outras situações que enfrentamos todos os dias.
Por fim, Devemos todos ser a favor da preservação da herança indígena, da recuperação do patrimônio histórico-cultural do índio, da pesquisa etnológica e sua divulgação científica, conscientizando a opinião pública e o próprio governo da “contribuição indígena à cultura brasileira e universal” e, desse modo, aliando-se aos índios em suas lutas por terra, educação, saúde e cultura. É o que pretendemos aqui nessa coluna Índios do nosso tempo. Teçam comentários, no blog, aguardo vocês , ate o próximo de natal!
artedomito@gmail.com
http://indiosdonossotempo.blogspot.com/



A RELAÇÃO DOS CIDADÃOS DO MUNICIPIO DE BENJAMIN CONSTANT COM O MUSEU MAGÜTA- POVO INDÍGENA TIKUNA. APONTAMENTOS SOBRE MUSEUS, AFINAL PRA QUE UM MUSEU?

Estimados leitores, vamos aqui para mais um artigo de nossa coluna, lembramos que mantemos um blog, http:/indiosdonossotempo.blogspot.com onde estão as matérias, com mais fotos (que salvo o primeiro artigo sobre o Congresso em Tarapoto –Peru, contou também com a colaboração de um fotografo do evento) que são de minha autoria, de povos indígenas do Maranhão, Mato Grosso, enfim...Nesta edição estaremos discorrendo sobre uma situação especifica e peculiar que havia lido há tempos atrás em um artigo do professor Jose de Ribamar Bessa Freire. O artigo “A descoberta dos museus pelos índios” se salvo engano, foi publicado em 1999, apontava sobre certo etnocentrismo, que agora estamos podendo vivenciar. Sendo este o tema que trata nossa coluna aqui, A RELAÇÃO DOS CIDADÃOS DO MUNICIPIO DE BENJAMIN CONSTANT COM O MUSEU MAGÜTA- POVO INDÍGENA TIKUNA. APONTAMENTOS SOBRE MUSEUS, AFINAL PRA QUE UM MUSEU?
Não tentaremos descrever ou explicar quem são os Tikuna, outras informações possíveis sobre este povo e a questão geopolítica que envolve o que este povo e o tema aborda, ver autores como João Pacheco, Curt Nimuendaju, entre outros (uma pesquisa pode ser realizada na biblioteca que há anexo ao museu Magüta), aqui me concentro numa perspectiva especifica de olhar a relação entre paisanos benjaminenses e indígenas.
A Formação do Museu Magüta deu-se em 1988, época da nova Constituição Brasileira, lembra-se? Neste época, os Magüta/Tikuna lutavam pela defesa e garantia de seu Território (hoje tudo parece mais tranqüilo com a OIT 169, entre outras melhorias no dialogo intercultural), mas neste recente passado os povos originários sofriam por todo país, e aqui nos rincões da Amazônia não seria diferente. Grupos armados, madeireiros entre tantos outros representantes da ‘frente de expansão’ entravam em conflito periodicamente com os indígenas.
Os Tikuna junto com pesquisadores de outros lugares do país, como a Dra. Jussara Gomes Gruber, passaram pelo menos três anos pensando/discutindo, a organização e montagem da coleção do Magüta. Bem, acreditamos que durante este período os indígenas puderam não apenas colaborar com as pesquisas dos etnólogos, historiadores e lingüistas, como também ‘incorporaram’ um importante “aliado” (alem dos pesquisadores e indigenistas que se imbuíram da causa) à sua luta e ao seu discurso étnico, pois na época, este povo estava em luta também para ser/ter reconhecido como um ‘grupo indígena brasileiro’ (o povo Magüta mantém território em outros países) e assim também seu Território reconhecido. O museu como arma, o museu espaço que daria/deu/dá à legitimidade ao movimento e reconhecimento aos indígenas enquanto diferença, demonstrou neste período ser um grande “aliado”.
Mas sofreram uma dura oposição por parte dos Políticos, (e atualmente percebe-se certa ‘invisibilidade’ perante a cidade, mesmo sendo principal atrativo turístico da cidade) Latifundiários, e principalmente os Madeireiros, chegando estes a cooptar apoio da população de Benjamim Constant para manifestações nas ruas, gestos de hostilidade, de ridicularizar e menosprezar a imagem do povo, categorizando os indígenas como “caboclos” (categoria mais próxima da possível idéia de ‘branco’ que são os paisanos locais que, o ‘branco civilizado industrial turista’ que se pretende demarcar enquanto distinção).
Em meio a protestos e ajuda da imprensa, que cumprindo seu papel apresentou os fatos denunciando as autoridades locais, o museu foi inaugurado em 1991, conquistando prêmios pelo esforço, destaque para “Museu Símbolo de 1995” pelo ICOM, e também o dado pelo IPHAN por sua preservação da cultura brasileira.
Mesmo sendo também importante a nível econômico- trazendo turistas ao município e movimentando a circulação de bens de consumo, informação, dinheiro e tanto mais, não recebe nenhum apoio, incentivo fiscal da prefeitura, não há nenhum tipo de convênio com a companhia de energia para isenção das taxas-e vez por outra estão em dificuldades, pois o que mantém toda estrutura nos dias atuais é praticamente a visitação de turistas que pagam cerca de cinco reais por uma visita guiada.
Curiosamente nos dias de hoje, o Magüta continua enfrentando se não tanto mais a hostilidade, com certeza a ‘invisibilidade’ e não participação dos cidadãos no dia a dia, na relação com o museu e sua história com a própria identidade da cidade e da população local. É um espaço para ser celebrado, mas é ignorado pela população do município.
O artigo de Bessa Freire, escrito já há algum tempo, que apontei no inicio de nossa coluna, vem descrevendo a situação que nos períodos iniciais da época de formação, inauguração do Museu Magüta (e que atualmente ainda insiste em persistir, mesmo que numa outra perspectiva- e é o que chamo aqui de invisibilidade do museu) os paisanos da referida cidade se referiam (fala o artigo) ao museu com certo ‘preconceito’ afirmando que museu é/era coisa de índio, menosprezando sua importância e tudo mais devido também aos fatos históricos brevemente descritos acima.
Bessa Freire vai estabelecendo ao longo de seu trabalho um comparativo com o conceito/idéia que os grandes centros urbanos como, por exemplo, São Paulo, Rio de Janeiro, e outras metrópoles têm/desenvolveram acerca de museus. As instituições museológicas têm, em sua formação o caráter de ser/pertencer às classes dominantes, aos interesses de um determinado pensamento cientifico/social, de quem controla o ‘sistema’ e/ou a ‘situação’. Os famosos “gabinetes de curiosidades” do século XIX, tudo com forte característica evolucionista.
Afinal o que constitui um Museu? Seu acervo? A história de sua sede?Os homens que assim o intitularam?E ainda, mas o que nele contém? História? Pesquisa? Coleções? O que o museu mostra?Ou pra que ele serve ou se propõe?
A idéia local dos paisanos sobre museu, afirma o artigo de Bessa, “vem de um etnocentrismo local contra aos indígenas que são tidos como caboclos, não mais índios autênticos”. Mas esquecem de questionar ou perceber que as ‘mudanças dessa autenticidade’ ocorridas com este povo (e outros mais ao longo da história de ‘contato’) foram em decorrência muito mais, por terem sido escravos no tempo dos seringais, por terem ‘aceito’ e alimentado o sistema exógeno que se apoderou de seus territórios, sua vida, cosmovisão, religião, do que uma feliz vontade. Foi e tem sido sim uma necessidade de “mudar para continuar sendo o mesmo”- diferente... Magüta antes de qualquer outra opção.
O artigo é um tanto irônico ao estabelecer um paralelo com a categoria de ‘caboclo’ para os locais, locais seriam os paisanos do município, que afirmavam perante a alteridade indígena Magüta, ser/pertencer à categoria de ‘civilizados’. Mas a categoria ‘civilizado’, defende o artigo, estaria condicionada a um tipo de perfil, que entre outras características, compreende a instituições museológicas como representante de seu conhecimento cientifico (e não coisa de índio), sua maneira (civilizada) de apreender o mundo, englobando outras culturas, cristalizando-as nas prateleiras e catalogações de acervos dos museus. Longe da concepção etnocêntrica e preconceituosa dos cidadãos do município.
Desta forma então, os paisanos do município seriam ‘caboclos’ (categoria negada por quase todos ‘brancos’ Amazônicos), e os Tikuna, índios, que com apoio de pesquisadores puderam concretizar o conceito de museu, um museu étnico de afirmativa indígena, mas, mais do que isso, de re-afirmativa, lá nos idos de 1992, eco-92, da pluralidade étnica, a diversidade intercultural que somos nós, todos brasileiros. Mas apesar de todo esse movimento e dos prêmios, a cidade ate os dias de hoje se mantém de olhos fechados para a preciosidade que é ter o Magüta na cidade.
Afirmar que museu é coisa de índio, fechar os olhos e não perceber ainda hoje, os erros cometidos, não fazer distinção é manter tudo o que todos nós estamos submetidos, as condições opressoras, de exploração e destruição, é continuar em pleno século XXI á ser colônia. Queremos expor que fora das amarras que nos vinculam a velhos rótulos podemos e devemos fazer a diferença, avaliar o conflito histórico, rever os preconceitos, nos humanizar e comungar juntos com nossas possíveis distinções.
O Magüta é a expressão de um não aceite a essa situação de forma passiva. Os museus construídos por não-índios não serão/são mais o monopólio do discurso histórico que lhes diz respeito. Com o museu Magüta, e outros que estão/foram construídos com o mesmo perfil, se pretende deixar de ser apenas um objeto musealizável e ser também – os povos originários – agentes organizadores de sua memória.
Se o conhecimento do índio for levado a sério pela ciência moderna e incorporado aos programas de pesquisa e desenvolvimento, os índios serão valorizados pelo que são: povos engenhosos, inteligentes e práticos, que sobreviveram com sucesso por milhares de anos na Amazônia. Essa posição cria uma “ponte ideológica” entre culturas, que poderia permitir a participação de povos indígenas, com o respeito e a estima que merecem, na construção de um Brasil moderno”.(POSEY,1992)
Desculpe por expor tão rápido os referidos assuntos eles dão muito “pano pra manga”, pra lembrar a amiga Barbara e, nos últimos dias aqui na região, acontecimentos é o que não esta faltando: o avião que caiu na TIVJ e que contou com o socorro dos Indígenas Matis, ate a germinação de um proto-movimento estudantil com greve e pedido de mudanças no Instituto Natureza e Cultura-UFAM.
É as mudanças demoram, mas chegam... que possamos sair da estagnação e projetar um futuro melhor pra região amazônica que não apenas exploração de seus recursos e da pauperização de seus moradores, apenas como ‘mão de obra’ barata. Ou com péssimas condições, sucateamento de educação, pesquisa, saúde, entre outras situações que enfrentamos todos os dias.
Por fim, Devemos todos ser a favor da preservação da herança indígena, da recuperação do patrimônio histórico-cultural do índio, da pesquisa etnológica e sua divulgação científica, conscientizando a opinião pública e o próprio governo da “contribuição indígena à cultura brasileira e universal” e, desse modo, aliando-se aos índios em suas lutas por terra, educação, saúde e cultura. É o que pretendemos aqui nessa coluna Índios do nosso tempo. Teçam comentários, no blog, aguardo vocês , ate o próximo de natal!
artedomito@gmail.com
http://indiosdonossotempo.blogspot.com/
texto publicado no jornal.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

ÍNDIOS DO NOSSO TEMPO- o espaço de dialógo intercultural


ÍNDIOS DO NOSSO TEMPO- o espaço de dialógo intercultural


Amigos da coluna Índios do nosso tempo saúdo a todos. Peço minhas sinceras desculpa por esse lapso de comunicação, mas algumas coisas estavam se acertando e realmente fora o link com o movimento da Terra Indígena Vale do Javari, muito pouco ou quase ninguém entrou em contato pelo email e colocou suas questões, para instigar você leitores, tratarei aqui de um tema polemico esperando que agora as pessoas entrem em contato e teçam comentários pró e contra a temática de nossa coluna ‘O INFANTICIO NAS COMUNIDADES INDIGENAS’.
Ressalto a todos os leitores, que o que se busca aqui e apontar diferentes visões e pontos de vista, sem nenhuma intenção de ser a verdade absoluta ou que somos os donos da verdade. Que temos realmente a certeza da atitude, do teor e da nossas decisões, que somos capazes de lidar e solucionar os mais diversos ‘problemas’ que se apresentam em nossa existência. A humanidade com suas peculiaridades e organizações sócio-culturais distintas elaboram ao longo da história formas distintas de lidar e se organizar perante os dilemas e tabus, construídos e destruídos ao longo de toda nossa formação.
A questão que abordo aqui é bastante polemica, pois envolve os direitos humanos, toda nossa formação educacional judaico-cristã e tem feito parte das discussões a respeito da cultura dos povos originários, há tempos atrás, andou circulando pela internet vídeos discriminando, repudiando e buscando realizar uma enorme campanha para se intervir junto às comunidades (mas do que já de costume) e proibir em sua totalidade o infanticídio praticado em algumas sociedades indígenas.
Muitas notícias veicularam a proposta de um projeto de lei que trata da obrigatoriedade de intervenção do Estado em realidades onde se supõe que o infanticídio ocorra, o projeto de Lei nº 1057 do deputado Henrique Afonso (PT-AC) conhecido como Lei Muwaji.
O projeto de Lei Muwaji se baseia nos direitos humanos, porem parte de premissas equivocadas e preconceituosas em relação ao tratamento concedido às crianças indígenas por distintos povos. O tema do infanticídio carece de dados confiáveis, seja sobre a incidência, seja em relação aos povos que recorriam a tal prática e, ainda, sob que circunstâncias.
Em grande parte dos trabalhos etnográficos apontam que ao contrario do busca-se apresentar, as crianças indígenas gozam de atenção da comunidade e os pais a acompanham as fases de desenvolvimento dos filhos, observando ritos de passagem e buscando o bem-estar de crianças e jovens.
Já os ‘especialistas’ do legislativo partem do pressuposto que os ambientes familiares indígenas são bárbaros, ao se referir genericamente à existência de práticas nocivas a vida das crianças.
O texto da referida lei, parti da infundada suspeita de que os índios são cruéis com suas crianças contribuindo assim, para desmoralizar e criminalizar a imagem do índio perante a opinião publica sem qualquer tipo de investigação e exposição mais ampla dos ‘dados’.
Com relação aos ‘dados’ é sempre bom antes de qualquer espécie de julgamento, a idéia de relativizar, colocar o dedo apontado exclusivamente para os povos indígenas camufla as praticas similares ao ‘infanticídio’ (aceitando a premissa que é isso que os índios realizam com as crianças que nasçam sob ou com algum tipo de ‘problema’) que ocorrem em um numero muito maior, sem sanção alguma em nossa ‘sociedade moderna industrial’, e desigual. Nos EUA, por exemplo, cerca de 1 milhão de bebês são vitimas de maus tratos todos os anos e não menos de 20% morrem em virtude disso. Milhares de crianças não indígenas são maltratadas e mortas no Brasil: de duas a seis são assassinadas por dia na cidade do Rio de Janeiro e outras tantas morrem por falta de alimentação e cuidados médicos.
Não se trata de ser pró ou contra o infanticídio entre indígenas, mas sim de assegurar o respeito às tradições culturais de todos os povos originários e, buscar compreender deles realmente, sua maneira de perceber, e entender não apenas o infanticídio, mas o mundo, sua maneira de explicá-lo, com também o lugar de onde vem, onde habitam e como vivem no coletivo, assim, aprendemos algo com os povos indígenas.
A criminalização de práticas indígenas e o incentivo à denuncia Propostos Na lei não promove o estimulo construtivo a reflexão sobre práticas que todos consideramos abomináveis.
Não usurpemos dos povos indígenas o direito e a liberdade de negociar os dissensos por meio de deliberações internas autônomas. Sabe-se que em toda sociedade os valores são construídos e reconstruídos socialmente. Mas não fechemos os olhos imaginando que políticas sociais como bolsa família ou algum tipo de incremento financeiro a famílias com filhos especiais, no caso indígena ira possibilitar a mudança do ethos/olhar e sua maneira própria de solucionar seus problemas.
Quanto aos valores e as soluções encontradas ate aqui pela ‘sociedade moderna industrial’ estão longe de serem referencias para um mundo melhor.
Criamos um dano ambiental global e estamos longe de estar caminhado na direção contraria ao colapso, então deixemos aos indígenas as escolhas que fazem para suas vidas e projetos de futuro.
As declarações internacionais das quais o Brasil é signatário foram concebidas para humanizar as relações sociais e não para servir como instrumento de intervenção em nome de uma suposta superioridade moral. Cabe assim ao estado de Direito proteger os povos indígenas Para que tenham o direito de existir como sociedades diversas, conforme a constituição de 1988, pela convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a declaração da ONU sobre os direitos dos Povos Indígenas, quaisquer documentos ou ações que interfiram na vida dos povos indígenas carece de consulta aos interessados, portanto que se proceda a consulta, pois ela é um direito.
Comentarios artedomito@hotmail.com
http//:indiosdonossotempo.blogspot.com

Índios do Nosso Tempo, Espaço na tentativa de celebrar e abrir um canal para o dialógo intercultural



Índios do Nosso Tempo
Espaço na tentativa de celebrar e abrir um canal para o dialógo intercultural


Apresentação
Através deste artigo apresento as intenções deste espaço sua origem desde seu nome ate atual busca pra estabelecer este como ponto de dialogo sobre assuntos e temas relacionados a situação atual dos povos indígenas.
A educação para uma cidadania plena implica, entre outros aspectos, assumir nossa sociedade como um complexo cultural, constituído historicamente e, em grande parte, formado ao longo de conflitos muitas vezes dramáticos. Nossas identidades são múltiplas, às vezes compondo-se de modo extremamente inovador, doutras de modo lamentavelmente excludente. No caso particular das culturas indígenas, além do reconhecimento de suas diferenças recíprocas (pois a categoria "índio" foi construída a partir da ótica colonizadora), é fundamental trazê-las para a visibilidade mais ampla da sociedade como um dos meios que permitam restituir sua dignidade e delas fazer parte constituinte e consciente do que somos. Este espaço pretende, neste sentido, oferecer os recursos, como a mídia de grande capacidade de abrangência e circulação, para documentar, propagar, promover a discussão e contribuir para a formação de cidadania das novas gerações.
O nome veio do projeto ÍNDIOS DO NOSSO TEMPO (Universidade com índios) teve origem em 2002 na Universidade Federal Fluminense onde participamos e desenvolvemos atividades como um projeto de extensão. Expedições de documentação na Terra Indígena Kanela, em 2003 na T.I Alto Turiaçu, junto à etnia Ka´apor, ambas no Maranhão. Além disso, foi realizada e filmada a apresentação do coral de crianças dos índios Guarani na aldeia Sapucaia- RJ e promovidas oficinas de pintura corporais, danças e cantoria durante Segundo Encontro de Culturas- Interculturalidades-Centro de Artes- Departamento de Difusão Cultural –UFF, Rio de Janeiro, entre outras atividades.
No ano de 2005, o projeto participou, na França, das comemorações do Ano do Brasil na França, com exposição, exibição de vídeo, palestras e com a participação de 08 indígenas Kayapo, atividades que foram realizadas com os apoios da PROEX-UFF, do MinC e das instituições francesas.
Os povos indígenas vêm sofrendo toda sorte de constrangimentos à sua sobrevivência física e cultural enquanto ‘povos’ culturalmente diferenciados.
Devido à influência de uma forma predatória de contato intercultural com a sociedade envolvente, ocorre um processo de descaracterização da cultura econômica e material destes indígenas e a desvalorização dos aspectos simbólicos (cosmologia; religião; etno-medicina xamânica; etc.) de sua cultura.
Igualmente surge um momento em que a sociedade global se questiona em relação aos seus valores e reconhece os conhecimentos destes povos, anteriormente tidos como “primitivos”; “irracionais”; “incivilizados” e outros tipos de desvalorizações racistas, de forma altamente valorizada. Principalmente em relação aos valores espirituais e ecológicos, os etno-médicinais, as culturas “tradicionais” e indígenas brasileiras passam a ser vistas, mais e mais, pelo pensamento científico; técnico e artístico, como fonte de inspiração e conhecimentos altamente positivos.
Desta forma, sem querer negar a história e o relacionamento interétnico, que transforma todas as culturas, e em grande parte favorece a própria cultura a se re-significar, tanto o povos indígenas quanto a nós, como a sociedade global em geral, poderemos ser beneficiadas por esta parceria.
Três as motivações que nos levaram a desenvolver, desde 2002, atividades relacionadas às culturas indígenas brasileiras (e que aqui serão como as diretrizes pra futuras publicações neste espaço):
1o) A escassez de informações às quais tem acesso a sociedade brasileira sobre a realidade vivida pelas populações indígenas, sua história e cultura e atuais desafios de sobrevivência e afirmação da identidade;
2o) A limitação de meios e oportunidades para que os próprios indígenas formulem e apresentem sua versão do mundo em geral e de suas culturas em particular;
3o) A necessidade de fornecer a estes grupos indígenas informações e conhecimentos sobre a sociedade abrangente a fim de proporcionar-lhes meios de melhor nela se situarem e de decisão sobre as formas de interação que lhes cabe decidir adotar.
É importante acrescentar que as sociedades indígenas são objeto, há séculos, de interpretações equivocadas e freqüentemente preconceituosas, fato que fortalece o nosso papel de contribuir para um esclarecimento que dissipe estas percepções. O espaço Índios do Nosso Tempo propõe um novo olhar, pretendemos contribuir para que as imagens apresentadas aqui, pelos próprios indígenas possam contribuir para uma visão mais próxima de suas realidades.
Resta esperar- e esta idéia tencione-se fomentadora desta nova visão, que as relações que com elas se estabeleçam a partir de agora sejam mais justas.
Buscaremos aqui nos apropriar e utilizar a mídia escrita para a documentação das culturas indígenas e como material para a preservação de sua memória, de esclarecimento da sociedade abrangente e como meio de intercâmbio e diálogo entre grupos indígenas distintos e destes com a sociedade em geral; e de fundamental a participação a incorporação de todos na elaboração, não só para lhes garantir maior autenticidade, mas para que se realize o ideal do dialogo.
Principalmente buscaremos ao longo das publicações problematizar temáticas que afligem, questionam e se acercam do universo indígena, discursos que dominam o consenso comum quando se defronta com uma outra cultura;
Envie suas propostas, comentários e sugestões para o endereço eletrônico artedomito@hotmail.com
Ate o próximo, com as propostas e temas sugeridos por vocês leitores!
Obs: a charge foi divulgada em um jornal do Peru sobre a situação dos índios isolados ha algum tempo atras, um amigo (Kiko) me cedeu.

Fotos do Congresso de Medicina Tradicional realizado em Tarapoto, junho/2009- Peru.







quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Relatos do Peru: o Congresso em Tarapoto e os acontecimentos em Bágua


Relatos do Peru: o Congresso em Tarapoto e os acontecimentos em Bágua

O Congresso Internacional de Medicina Tradicional, Interculturalidade e Saúde Mental que aconteceu em Tarapoto no Peru, abordou temas de profundo interesse para uma política sobre conhecimentos tradicionais Indígenas, e principalmente na busca de um melhor dialogo com os países da América latina.
Foi organizado pelo Takiwasi (casa do canto), é um centro de reabilitação de toxicômanos e de pesquisa sobre medicinas tradicionais. Fundado em 1992, na alta Amazônia peruana, tem como seu objetivo geral valorizar os recursos humanos e naturais das medicinas tradicionais elaborando uma verdadeira alternativa terapêutica.
O Congresso teve como proposta, o dialogo sobre as plantas tradicionais amazônicas suas utilizações rituais e terapêuticas com forte enfoque nas relações interculturais e na abordagem das questões pertinentes aos “xamas mestiços” (e /ou também conhecido como neo-xamanismo, onde não-indígenas são ‘legalizados’ nas praticas xamanicas) percebendo as potencialidades e a problemática destas praticas na valorização e reconhecimento da matriz indígena de transmissão e utilização deste conhecimentos.Voltado para dimensão espiritual e da utilização das plantas psicoativas que induzem a estados alterados da consciência, como técnicas alternativas de tratamento.
Há algumas décadas existem múltiplas experiências, de projetos interculturais entre médicos, curandeiros, iniciativas no campo terapêutico, educativo, acadêmico, de investigação. A diversidade e dispersão dessas práticas não permitem ter uma visibilidade adequada. E este evento possibilitou o encontro de indígenas e de diversos pesquisadores de todo mundo nas áreas de antropologia, medicina, psicologia entre outros.
Teve como prioridade dar a palavra a pessoas com experiência clinica, a projetos interculturais principalmente relacionados à saúde mental e que se atreva a tratar abertamente dos temas “tabu”. Buscou também falar sobre as potencialidades das medicinas tradicionais e também de suas possíveis limitações.
Foi uma grande possibilidade de promover a preservação e desenvolvimento das medicinas tradicionais, seus estudos, as condições de uso, fomentando uma articulação com a medicina ocidental e outros beneficio para os povos indígenas como para sociedade como um todo.
O congresso ficou dividido nos eixos temáticos:

- Política em saúde mental, interlocução das medicinas tradicionais.
Neste eixo realizei uma apresentação sobre os dilemas indígenas do Vale do Javari, suas angustias, os altíssimos casos de malaria e hepatite. Fazendo um contra ponto com sua maneira tradicional de perceber o conceito de saúde e doença e também apresentando como exemplo, a história de pós-contatos do povo Matis.

- Toxicomania e estados alterados de consciência.

- Saúde mental e povos indígenas.

-Medicina tradicional e psicoterapia.

-Investigação cientifica e interculturalidade.
Aqui neste tema pude aprofundar os conceitos de saúde e doença de alguns povos indígenas, onde o conceito de saúde que perpassa por estar e se manter saudável, bem disposto. Apresentei alguns projetos que desenvolvo com os Kayapo (povo indígena do Estado do Para, seus produtos e medicina da floresta) e o recente projeto sobre as plantas da farmacopéia Matis, onde pude sensibilizar os participantes para questões sobre o desrespeito que durante anos fez com que estes indígenas fossem se “esquecendo” de suas praticas, e criando cada vez mais uma dependência com relação aos medicamentos da sociedade envolvente. Pude, desta maneira apresentar o trabalho de pesquisa que apoio do jovem professor pesquisador Make Bush Matis, que junto a alguns velhos como, Tumi Preto e Tupa Matxon vem construindo um grande catalogo sobre seus métodos, plantas, e formas de tratamento.
O congresso ainda realizou uma serie de vivências sobre utilização de plantas e praticas de estados alterados de consciência.
Mas nem tudo foi, e ou esta uma maravilha (ate o fim desta edição a solução estava longe de ser encontrada) ao iniciar o congresso houve um grande conflito na cidade de Bágua, impossibilitando a chegada de alguns participantes que viriam por via terrestre.
O conflito (que aconteceu nuns sábado dia 6 de junho) ocorre, pois a concessão que o governo peruano vem realizando se sobrepõe aos territórios indígenas e ainda mais, a justificativa de tal mobilização indígena acontece, pois o governo vem fazendo uma serie de decretos legislativos que são verdadeiros atentados aos povos indígenas, beneficiando o Tratado de livre comercio e aos EUA, fazendo propostas nos temas florestais, de água, desapropriação de terras em beneficio das empresas transnacionais.
O pior de tudo é que em nenhum momento os povos indígenas foram consultados o que desrespeita a lei 169 OIT, que exige a consulta previa aos povos originários. Desta maneira essas leis deveriam ser revogadas o que não aconteceu.
É um verdadeiro movimento para o desaparecimento dos povos indígenas para que as transnacionais se utilizem dos “benefícios” como a mineração, exploração de Madeira, gás e petróleo.
A AIDSEP (Associação inter-étnica para o desenvolvimento da selva peruana), junto com outros movimentos e povos indígenas, mestiços organizaram o fechamento da estrada durante 56 dias, então o governo decretou Emergência em Bágua, o que o autoriza entre outras atrocidades a entrada da policia e de matar para manter a “ordem”. Criminalizando os protestos.
Segundo a versão do governo de Alan Garcia, seriam três indígenas e 24 policias, mas relatos de motoristas que passaram pos conflito pela estrada, seriam mais de 30 mortos que estariam expostos ao longo da beira da estrada, corre ainda mais informações que foram encontrados corpos em sacos plásticos ao longo do rio, mas essas são informações não oficias já que o governo controla as informações.
Mas mesmo assim a atrocidade cometida no dia 6 de junho já desencadeou a renuncia de ministros do governo.
O governo peruano por outro lado culpa o presidente da AIDSEP, O senhor Alberto Pizango de ser o responsável pelo distúrbio, este teve que se refugiar na embaixada da Nicarágua, e aguarda ate o momento a autorização para se manter em asilo político.
Muito ainda vai acontecer para se manter informado consulte http://www.servindi.org/ e http://www.aidesep.org.pe/
Pode parecer que não é nada para nos os Brasileiros, mas lembrem-se, é só mais um exemplo do fracasso da política da sensatez e do dialogo e de negociação como mecanismo de solução da diferença, é o triunfo da intolerância, prepotência, da balas e da morte, nem tanto distante dos massacres ocorridos na T.I. Raposa Serra do Sol, e em tantos outros rincões de nosso território que não chega aos meios de comunicação, fiquemos atentos.

Textos Rafael Pessoa - antropólogo
Fotos Rafael Pessôa e Ramiro Solsol Conde